Ramon Rocha Queiroz deixou a vida pacata em Rio Branco, no Acre, para rapidamente se tornar o principal nome do fisiculturismo no Brasil. O esporte, antes visto com preconceito, cada vez mais ganha fãs e adeptos por causa do seu personagem mais famoso: o “Dinossauro do Acre”.
Não foi apenas o corpo de Ramon Dino que sofreu inúmeras mudanças nos últimos anos. A vida dele tem mudado da mesma forma que os músculos que desenham um dos fisiculturistas mais premiados do mundo. Se antes o pedido era para comprar ovos fiado na feira para manter a dieta, no presente o gasto mensal com salmão ultrapassa R$ 10 mil.
gora, ele deseja transformar o preconceito que o fisiculturismo carregou por anos e alavancar a prática do esporte no Brasil.
– Não era muito bem aceito antigamente. Hoje em dia, principalmente com os influenciadores, a gente consegue demonstrar o trabalho mais ali pelos bastidores, as pessoas começam a entender um pouco mais do esporte e querem até fazer parte.
– São exatamente esses fatores [uso de anabolizantes, estereótipo de homem forte e agressivo]. Mas hoje em dia está muito diferente, o pessoal sabe que é um trabalho de esforço, dedicação todo santo dia – disse Ramon Dino.
O sucesso, o dinheiro e também as críticas em torno de seu desempenho no fisiculturismo tornam a vida de Ramon Dino comparada à de muitas celebridades nacionais: o atleta mal consegue caminhar por qualquer local público sem ser abordado.
– Eu já me acostumei, antigamente era um pouco mais difícil, até ficava me questionando por que as pessoas viam tanto assim, mas a gente sabe que hoje é admiração, e as pessoas querem ter aquele momento contigo porque acompanham, torcem por você, é o carinho que elas querem da gente.
Tudo isso aumentou depois da participação no Mr. Olympia 2024, em Las Vegas, nos Estados Unidos.
Com expectativa de desbancar o astro canadense e pentacampeão Chris Bumstead “CBum”, Dino ficou apenas em quarto lugar. O resultado repercutiu como uma derrota da seleção brasileira na Copa do Mundo. O motivo? A consolidação de Ramon como astro de um esporte em ascensão no Brasil.
– Nos primeiros dias eu fiquei bem abalado, né? Mas depois surgiu a competição aqui do Brasil, então eu foquei totalmente nela. Eu não fiquei pensando em problemas, mas logo volto com as minhas sessões com a terapeuta – contou Ramon.
Em entrevista de pouco mais de uma hora ao Abre Aspas, na sede da Globo em São Paulo, Ramon Dino abriu o jogo sobre a carreira, a preparação para o Mr. Olympia, o futuro e o uso de anabolizantes.
Ficha técnica
- Nome: Ramon Rocha Queiroz (Ramon Dino)
- Nascimento: 09/02/1995 (29 anos)
- Profissão: fisiculturista
- Peso e altura: 103kg (em competição) e 1,81m
- Carreira: Mr. Olympia 2024 (4ºlugar); Mr. Olympia 2023 (2º lugar); Mr. Olympia 2022 (2º lugar); Mr. Olympia 2021 (5º lugar); Arnold Classic 2024 (2º lugar); Arnold Classic 2023 (1º lugar); Arnold Classic 2022 (2º lugar); Mr. Olympia Brasil 2018 e 2024 (1º lugar).
Abre Aspas: Ramon Dino
ge: Quem é o Ramon Dino?
– Eu me chamo Ramon, conhecido como Ramon Dino, tenho 29 anos, pai de duas lindas crianças, casado com a Vitória, atleta profissional.
Qual foi a grande mudança no esporte e na sua vida nos últimos anos?
– Além do crescimento que teve no esporte, vários atletas também adentrando, muitas empresas começaram a olhar diferente, querendo investir, estar junto no time. Acho que mais isso mesmo.
A grande mudança talvez seja um preconceito menor das pessoas com o esporte?
– Exatamente por questão do preconceito, né? Não era muito bem aceito antigamente. Hoje em dia, principalmente com os influenciadores, a gente consegue demonstrar o trabalho mais ali pelos bastidores, as pessoas começam a entender um pouco mais do esporte e querem fazer parte.
Preconceito em qual sentido?
– É exatamente esses fatores [uso de anabolizantes, estereótipo de homem forte e agressivo]. Mas hoje em dia está muito diferente, hoje em dia o pessoal sabe que é um trabalho de esforço, dedicação, todo santo dia.
Qual foi o ponto de virada do preconceito para a admiração dos fãs?
– O esporte aqui no Brasil está crescendo mais agora, né? Mas lá fora ele já era bem mais aceito. Eu acho que a partir do momento que a gente começou a falar mais sobre o que a gente usa, sobre como a gente faz, sobre o que pode servir de bom para você. Aí as pessoas começaram a olhar com um olho diferente.
Por que você decidiu virar fisiculturista?
– Foi um convite. Primeiramente foi um convite do meu primeiro coach [treinador]. Fiz minha primeira competição em 2016. E eu comecei a gostar bastante do esporte, acho que depois de um ano competindo ali, depois de participar da minha primeira competição e ganhar a vaga para o próximo e fazer minhas preparações, eu comecei a curtir o esporte.
Você imaginava que alcançaria o sucesso de não conseguir andar na rua sem ser abordado?
– Eu já me acostumei, antigamente era um pouco mais difícil, até ficava me questionando por que as pessoas viam tanto assim, mas a gente sabe que hoje é admiração, e elas querem ter aquele momento contigo porque acompanham, torcem por você, então é isso, é o carinho que elas querem da gente.
Você gosta desse assédio?
– Hoje em dia é mais tranquilo, né? Porque a gente já sabe que vai ter um público torcendo e esperando no final. Então é só fazer da melhor forma, com um sorriso no rosto, um abraço apertado, um aperto de mão, sabe? Às vezes as pessoas só querem isso mesmo, serem bem tratadas: “Ô Ramon, eu existo, eu acompanho teu trabalho”. Só da pessoa estar ali contigo, ela já se sente satisfeita.
Ainda nessa questão de culto ao corpo, a gente vive num mundo que exige das pessoas cada vez mais essa perfeição. Você trabalha com o corpo, com o culto ao corpo, como é a sua questão de saúde mental com relação a isso?
– Cara, é um trabalho diário e geralmente a gente é acompanhado com a Anahi, que é uma psicóloga minha e da minha esposa, então ela ajuda bastante. Não só no dia de treino, não só no trabalho, como em todas as partes da vida, eu acho que é necessário ter um acompanhamento assim, sabe? Acho que fica muito mais fácil de lidar com as coisas.
Falando especificamente do resultado do Olympia, você precisou de ajuda psicológica depois de toda a repercussão que rolou?
– Nos primeiros dias eu fiquei bem abalado, né? Mas depois surgiu a competição aqui do Brasil, então eu foquei totalmente nela. Eu fiquei pensando em problemas, mas logo volto com as minhas sessões com a terapeuta.
Como é sua preparação para uma competição como o Olympia, por exemplo? Conta como funcionam os ciclos de preparação, por favor.
– A gente tem fases, a fase de off ou bulking e tem a fase de cutting. A fase do off é uma fase onde você consome bastante calorias, até consegue treinar mais pesado por estar consumindo mais calorias. É um trabalho para ganho [de massa muscular]. Aí o trabalho de cutting já é o contrário, é um trabalho mais de lapidação. Trazer um pouco mais de condicionamento, tirar a gordura, um pouco da água e mostrar todo o trabalho que você fez no ano ali no palco.
Nesse momento, você está em que parte da sua temporada?
– Eu acabei de sair da competição, então é off. A gente tem um ano inteiro de off até o próximo campeonato, que é o Mr. Olympia 2025. A gente nunca teve esse tempo todo, esse longo tempo aí, então acredito que vai ser muito bom. E a gente vai trazer um condicionamento e um volume diferente.
Mas nesse momento você não larga, você não come tudo?
– Sim, geralmente são os primeiros dias que a gente aproveita bastante, que sente aquela vontade de comer o que não estava podendo. Depois que se satisfaz, não sente mais tanta vontade, começa a comer mais limpo e volta para os treinos.
Quanto que você chega a pesar no off? Quanto você precisa perder de peso até o dia do show, por exemplo?
– 123kg. Em cutting, que é o limite de peso que tem que bater no palco, a gente chega até 103kg, máximo, o limite. Tem competições que já cheguei a bater 98kg, 96kg.
E essa perda de peso, em quanto tempo?
– A gente faz um trabalho de 12 semanas. Aí, durante essas 12 semanas, aquele 118kg, 120kg até o dia da competição.
Depois da pesagem do evento, você fica livre para comer? É o que acontece com os lutadores, por exemplo.
– É, depois que bate o peso, dependendo de como está a minha condição, geralmente faço algumas refeições livres que é para começar a encher já a partir dali. Porque como você fez um trabalho para perda de peso, você chega no seu limite e está totalmente magro. Seu corpo está pedindo comida. E como tu vai se apresentar e tem que mostrar um volume, aí tem que comer bastante, esse volume vai aparecendo com o tempo.
Nessa fase de bulking, você consome quantas calorias diariamente?
– Não tenho a mínima ideia, mas é bastante. É bastante [risos].
Você gosta de comer ou é um sacrifício para você?
– Tem fases que é sacrifício, que você tem que infelizmente empurrar a comida. Mas tem fases que é muito bom comer. Geralmente é mais quando você está conseguindo ter o gasto calórico e consegue sentir fome. Se não está treinando muito gasto calórico, aí tem uma dificuldade imensa para comer. E é a parte mais chata. E a parte mais chata também é na finalização, que você não pode beber água direito, nem comer direito. E tem que continuar treinando muito pesado, fazendo cardio.
Essa é a fase mais difícil?
– É, para o corpo é. Porque você tem que levar ele ao limite, né? Em off, você está comendo bem, está treinando e tal, com força. É diferente.
Você achou que podia ganhar o Olympia, Ramon?
– Achei. Estava convicto disso porque tinha feito um trabalho impecável. Estava muito confiante, infelizmente não aconteceu.
Você manteve a confiança quando viu seus concorrentes em Las Vegas?
– Quando eu fui para Las Vegas, foi um pouco, um mês de antecipação do dia do campeonato. Então a gente já foi preparando o campo. Foi mais na nossa intenção mesmo de fazer o nosso trabalho, mas a gente com certeza topou os caras. Chamei uns para fazer pose, para ver como é que estava o shape, então foi legal. Fiquei bem confiante a partir desse momento que comecei a comparar. Mas, surpresa, né?
Surgiram muitos “especialistas” no esporte nas últimas semanas, criticando e analisando a sua preparação. Qual o seu recado para essas pessoas? Qual o ponto positivo e negativo na sua preparação para o Olympia?
– O ponto positivo foi que me dediquei ao máximo e mais do que o máximo. O ponto negativo foi só o resultado que tive de toda essa preparação e essa surpresa, infelizmente. Não tem como falar que fiz algo de errado. Fiz tudo como deveria ter sido feito e 110%.
E a opinião dos influenciadores do segmento sobre o seu desempenho?
– É, infelizmente são opiniões. As pessoas têm opiniões que agregam para você e opiniões que não valem de nada, então eu peneiro ali o que é bom. Mas eu acho que, na visão deles, é certo para eles, né? Então, de algum modo, eles estão querendo palpitar algo bom pra você. Mas, geralmente, não acaba sendo um bom palpite. As pessoas têm que procurar entender, também, todo o contexto. Quem é o Cris Aceto, quem é o Faixa Preta, meu treinador, quem é a Max Titanium, tudo que está envolvido, sabe? Antes de começar a criticar. Por causa de um erro ser criticado é chato, né?
A imagem do seu suor no palco rodou o mundo. O que aconteceu?
– É, infelizmente eu ainda não tenho essa resposta do que aconteceu. Acho que pode ter sido alguma coisa a ver com as medicações que eu estava tomando, que eu tive uma inflamação na garganta. Acho que posso ter sido prejudicado por causa disso ou algum alimento no momento ali ter tido bastante sódio, ou então bastante açúcar. Talvez o nervosismo por ter sido puxado para o quarto lugar ali na hora das prévias. Então são muitas coisas para analisar, sabe?
Você falou que na fase final fica sem beber água praticamente. Em tese, o seu corpo teria que estar sem água naquele momento. Por isso que vocês acreditam que pode ser um remédio, um alimento, alguma coisa assim?
– Não tem como tirar 100% da água do corpo. Sempre vai ter água no teu corpo. Aí o que pode acontecer é alguma química, que foi o que aconteceu no palco, um cálculo errado de sódio e de água também no momento. Acredito que tenha sido isso.
Você tomou uma decisão com relação a sua equipe?
– Cara, ainda não. Nosso time está conversando sobre, o time da Maxi Titanium está com a gente também. E não é só chegar e trocar, tem que procurar uma pessoa certa, tem que saber o que você está fazendo de verdade, tem que ter certeza, né? E a gente ainda está em reuniões, conversando com o pessoal.
Como você filtra as críticas e opiniões para tomar decisões na sua carreira?
– Como tem muitas pessoas falando, eu procuro ouvir quem realmente está comigo, quem se importa e que tenha algum peso na palavra para mim. As pessoas que estão fora, que eu nem conheço, que eu nem tenho intimidade, costumo não dar muito ouvido não. E ficar muito focado em ler comentários negativos você acaba meio que se apegando a alguns, ficando triste.
Você está satisfeito com seus treinos e sua preparação?
– Cara, eu estou satisfeito. Esses anos todos que a gente trabalhou junto foi com boas colocações, então a gente realmente estava fazendo o trabalho certo e bom. Acredito que seguir outros padrões também seria interessante, sabe? Mas não tenho nada a reclamar do Cabra, simplesmente está comigo ali. Ele não gostou disso, não.
Você acha que ainda está longe do seu limite, do seu auge físico?
– Cara, como eu estou muito recente no esporte, só que foi muito rápido a nossa crescente, então ainda não extraí o máximo do meu limite. Acho que tem como ir muito mais além, tem como crescer muito mais. É só fazer um trabalho certo, até porque eu não posso ganhar muito, porque não consigo bater peso na categoria. Mas acredito que ainda tenho muito para fazer e muito para mudar.
Como funciona essa questão da categoria, peso, etc?
– Tem alturas que você vai bater. Eu tenho 1,80m e preciso bater 103kg. Quem tem um metro e um pouco mais para cima tem que bater 106 quilos, ou seja, ele tem uma margem maior para dominar. Já os baixinhos vão ter que diminuir um pouco, então varia muito. A categoria Open não precisa bater peso, você só tem que chegar no condicionamento, categoria menor você tem que bater peso e a altura. A diferença é que você sobe de pé e muda.
Quais os pontos que fisicamente você tem trabalhado como prioridade?
– Competições passadas eu ouvi dizer que eu tinha que melhorar costas e posterior, mas como a gente já fez esse trabalho, então acho que agora é só trabalhar no completo, no geral, e trazer a melhoria no topo.
Como são debatidas as estratégias de preparação?
– A gente vai baseado mais ali pelo feedback dos árbitros, né? Eu desço do palco, geralmente quando não ganho, e vou perguntar o que eu fiquei devendo, o que eu preciso melhorar. Aí eles falam os pontos, mas você tem que ter a harmonia ali.
Como é a arbitragem no fisiculturismo? Existe um questionamento como no futebol, por exemplo?
– Confia bastante, até porque não é só um árbitro. São vários. Todos eles entram no consenso, dão as notas, dão suas opiniões e fazem a soma. E eles definem o campeão. Então não tem como falar que roubou, sempre um vai estar ali, eu dei ponto para ele, ele estava ruim. Varia muito.
Você e o CBum (outro fisiculturista) conversaram depois do Olympia?
– Não, não. Só mandou mensagem depois. Até porque, pô, ele tinha que comemorar e fazer as paradas dele, então eu também estava querendo comemorar com meus amigos e tudo. Mas a gente sempre só conversa mais depois mesmo. Sempre nos falamos depois.
Ele vai sair da sua categoria, gostou da notícia?
– Não, não gostei. Eu queria ter vencido ele, estava no propósito de vencer ele. Mas ele fez a escolha dele, né? Foi uma boa escolha também.
Você se vê como sucessor dele?
– Eu acredito que eu vou ser campeão. Mas como eu já falei outras vezes, todos têm o potencial também para ser campeão. É só não falhar, entendeu? Acredito que ano que vem vai ser nosso.
Você deu um sorriso quando falamos da saída do CBum, acha que ficou confortável para ele deixar categoria agora?
– Ele fez o legado dele e quem acompanha o esporte assim sabe que é muito difícil. Manter-se como campeão, e o eu admiro para caramba. Fiquei feliz por ele ter decidido sair como campeão da categoria, mas eu queria ter tirado o título dele.
Você tem noção da importância e da representação que tem para o esporte? Acha que pode ser o “Pelé” do fisiculturismo?
– Eu tenho confiança nisso. Eu acredito que está bem próximo disso acontecer. E a gente vem recebendo sinais, né? Então, seja o que Deus quiser, que seja isso.
Ramon, poderia explicar o que são anabolizantes e como eles fazem parte do fisiculturismo?
– Anabolizantes são hormônios que a gente usa durante a nossa preparação. Claro que a gente passa por um médico, por profissionais, não é por aventura. Eles trazem, de fato, risco, mas se você fizer o uso errado, o uso abusivo. Quando você tem acompanhamento, quando é do esporte, começa a dar bastante valor à vida. Então, também tento passar isso para as pessoas, nos nossos vídeos, nos podcasts e tudo.
Como funciona o acompanhamento?
– Costumo fazer os exames após os campeonatos, tenho acompanhamento do Paulo Muzy também, que é um médico renomado, e vários outros profissionais. É a tua vida, é o teu corpo, é o teu trabalho. Então tem que ser um dos pontos assim que você deve deixar como prioridade para fazer, cuidar da saúde.
Há fisiculturismo sem anabolizantes?
– Agora começaram a aparecer campeonatos para naturais, então é possível hoje ter competidores naturais. Mas para chegar na proporção que a gente chega, o tamanho que a gente chega, é muito difícil ser natural. Leva muito tempo.
Esse auxílio com anabolizante é o ano inteiro ou você tem momentos que também fica 100% limpo?
– Graças a Deus não, eu não faço isso o ano inteiro. Eu acho que mexe bastante com tudo, desequilibra muito. Fazer isso por muito tempo é um negócio que prejudica. A gente tem uma quantidade mínima e, graças a Deus, minha genética favorece também para não precisar usar tanto. Então, para mim, eu uso muito pouco, é suave.
Há um controle da organização dos campeonatos grandes do que cada um está usando ou não?
– A gente que define, e só mostra lá no palco, o shape. A única coisa que importa é a cara.
Como é o trabalho dos fisiculturistas para não deixar que o acesso aos anabolizantes afete a vida das pessoas que não precisam tomar?
– Cara, se você não for do esporte, não faça. Se você tem curiosidade de entrar no esporte, vá com calma e procure um profissional que te auxilie.
E qual dica ou conselho você dá para quem quer entrar no fisiculturismo?
– Mantenha a sua constância, a sua fé. Utilize os recursos que você tem. Aproveita as oportunidades quando aparecer. Escute bastante quem tem para te ensinar.
Conte a história que você comprava ovos fiado na feira…
– Comecei a fazer uma preparação para tirar o cartão profissional e deixar de ser atleta amador. Eu estava passando por uma dificuldade financeira, sem trabalho, morando de aluguel. Mas eu tinha um patrocínio, então aqui e acolá eu vendia minhas coisas para ter um dinheiro e pagar esse carinha da feira. Eu chegava nele e pedia umas cartelas de ovo, fiado, e consegui fazer minha preparação. Estou praticamente completo com ovo e arroz, até a final. Cheguei a São Paulo comendo ovo e arroz. Ganhei meu cartão profissional comendo ovo e arroz. Obrigado, Deus, pelos olhos da vida e pelo carinha da feira também.
E o que passa na cabeça diante da sua situação atual vendo tudo que passou?
– É muito louco olhar, saber de onde você saiu, tudo que você passou. Hoje eu olho para as dificuldades e faz sentido, sabe? Era um ensinamento para mim. Mas no momento da dificuldade eu ficava reclamando muito, até aprender que aquilo ali era um ensinamento. Tomei decisões erradas, como todo mundo faz. Eu me arrependi de muita coisa, mas foquei sempre em me dedicar a fazer o que eu sempre amei. Foquei também em querer andar pelo caminho certo. E Deus aí vem abençoando a gente, sabe? Então, se estou tendo tudo que tenho hoje é porque fiz de alguma forma para merecer.
Qual o lado bom e o lado ruim da fama?
– Cara, o lado bom é que você sempre é bem querido, bem recebido. Algumas coisas ficam muito mais fáceis. O lado ruim é exatamente os haters, as críticas, assim que acabam atrapalhando até você ver que não tem sentido algum dar ouvido para aquilo. E algumas pessoas que também chegam por interesse.
Já se decepcionou com muita gente?
– Eu me arrependi com muitas pessoas desse meio. Eu ouvi muitas coisas a meu respeito, aconteceu, pelo menos agora, sei em quem não confiar.
E quem você conheceu com a fama que não acreditou por ser tão fã?
– Um deles foi o Rafinha Bastos. Velho, sou muito fã do trabalho dele. Rafinha Bastos é um comediante, para quem não conhece. Cara, e ele me convidou para o podcast dele. Então para mim foi foda. E eu tinha duas peças dele, duas peças não, dois shows dele decorados, uma hora e pouco de show. Então, cara, muito legal essa parte de pessoas que você admira, também admiram seu trampo, sabe?
O que você gosta de fazer quando não está treinando, sendo pai e marido?
– Dormir, tirar uma soneca e comer. Curto muito estar com a minha família, curto muito escrever, quando eu estou com tempo. Curto muito estar com meus amigos, isso não acontece direto por eu estar em preparação e não ter como ficar convidando para fazer um churrasco em casa, enquanto eu como uma tilápia com arroz [risos].
Você é um cara tranquilo com relação à alimentação das outras pessoas que estão ao seu redor?
– Depende do momento. Se eu tiver em cutting, fico revoltado. A pessoa sabe que eu estou ali passando a fome e passa com um sanduíche ou com lasanha. Não dá para ter escolhido outra hora para isso? Mas é um trabalho também.
As pessoas têm curiosidade do aspecto financeiro, de como que um atleta de fisiculturismo hoje sobrevive. Qual a realidade do esporte?
– Você tem que ser influência, tem que trabalhar tudo ali fora também pra você ser bem reconhecido. Se for em questão de patrocinador, se você tiver um bom patrocinador que invista no suplemento, um bom patrocinador que invista na alimentação, no que está precisando, não precisa de muita coisa.
Quanto você gasta por mês com alimentação?
– É a minha esposa que sabe mais ou menos quanto que a gente gasta de alimentação. Só de salmão a gente deve gastar em torno de R$ 10 mil por mês. Vai ter ovos, tem frango, carne, alimentação no geral, GH, muitas coisas. Por isso é difícil falar um valor.
E como foi passar do arroz com ovo para o salmão e o que quiser e precisar comer?
– Do arroz e ovo para o arroz com salmão tem uma diferença enorme, mano. Só que a gente começa a valorizar mais, sabe? A gente olha para trás, vê tudo que passou. Minha esposa também sempre me orienta. Ela fala: “Olha de onde você veio, o que você tem agora, onde você está chegando”. Então, cara, eu fico muito feliz. Muito satisfeito.
Você levou puxão de orelha em algum momento por estar mudando por causa da fama?
– Cara, não. Porque é o que eu mais peço pra Deus, sabe? Deus não me muda, não me deixa perder minha essência, minha humildade, que é o que todo mundo fala. Então eu busco sempre me manter do mesmo jeito.
Realizou todos os sonhos financeiros e pessoais? Tem alguma coisa ainda?
– Pessoalmente, alguns, que era ter meus filhos, minha família e dar uma condição para os meus pais, é um dos sonhos que estou realizando também. Mas ainda tem muita coisa para fazer, muita coisa para conquistar. Um deles é o Olympia.
No seu mundo ideal passa por ser reconhecido como um atleta que mudou o fisiculturismo no Brasil?
– O que quero trazer para o público, a forma que a gente trabalha, a nossa dedicação, a nossa crença em Deus também. Eu acho que é esse o nosso maior trabalho.
Gosta de ser influenciador? Como é a relação com as redes sociais?
– Eu não gosto muito de ficar na frente das câmeras, mas é uma coisa que eu me acostumei, que eu levo como trabalho. É uma coisa que eu tenho que aprender também a fazer direito, porque eu sou muito atrapalhado, como vocês podem ver.
Como é o Ramon Dino em casa? Leva bronca por apertar demais a tampa da garrafa de água?
– A única briga é quando eu deixo a garrafa no lugar errado, toalha na cama. Todos nós fazemos isso. A nossa missão é encher o saco.
Você é um marido fofinho, Ramon?
– Olha o meu tamanho, já assusta, né? Se eu for um cara grosso, piorou, né? Então eu tenho que ser o mais fofinho possível, principalmente agora que eu tenho uma filha menina e um filhinho também. E eles já fazem isso, não tem como.
E como lida com as zoeiras da pintura do corpo, de usar sunga etc?
– Os caras falam bastante: “Ih, essa cuequinha aí socada, essa tintinha bronzeada”. Os caras falam, mas a gente leva como brincadeira mesmo. Falo que ele queria estar no meu lugar [risos].
A cor da tinta que passam no corpo é escolhida por vocês?
– Cara, depende, porque como não estamos no palco, não sabemos qual é a cor da luz. Então a gente meio que chegou nas prévias [Mr. Olympia Brasil], bem morenão, mas depois nas finais falaram assim, ó, tem que mudar a cor da tinta. Lá vai tirar, tinha que tomar um banho e passar outra mão ali. Mas demora uma questão de semanas, quase meses para sair totalmente a pintura.
E o tamanho da sunga?
– “Ih, lá ele”. Não, não, a sunga tem seus tamanhos, a gente ganha algumas, compra outras.
Existe uma espécie de “RamonDinoMania” no Brasil?
– Cara, eu já tinha competido aqui no Brasil. Competi na Olympia, fiquei naquela colocação, fiquei com medo de chegar aqui no Brasil e não ter toda essa repercussão, carinho. Mas foi muito diferente do que eu esperava, o público super, super, super carinhoso, sabe? Devo muito a esse público, então foi isso também que me motivou a competir. Minha esposa também me ajudou bastante a manter a cabeça no lugar para competir. Você tem que, querendo ou não, onde você vai, você tem que dar recepção para as pessoas que estão indo lá, te cumprimentar.
Você é vaidoso?
– Cara, quando comecei a ter condições eu comecei a ser mais vaidoso, né? Também fiquei com medo da minha mulher me deixar. Não, tem que me cuidar, porque senão a mulher me deixa, né? Eu gosto bastante de perfume, mas vai em semanas, mano. Eu gosto muito de perfume.
Teve algo que você comprou que não acreditou que estava pagando aquele valor?
– Acho que foi um presente que a minha esposa me deu. Foi um sapato de quase R$ 20 mil, daqueles de andar nas nuvens e dá até dó de pisar no chão.