Conforme dados divulgados pela ONG Global Witness, nesta terça-feira (10/9), o Brasil é o segundo país no mundo que mais mata ambientalistas, atrás apenas da Colômbia.
De acordo com o levantamento da organização, sediada no Reino Unido, em 2023, pelo menos 196 ativistas foram assassinadas em todo o globo por defenderem o direito à terra e ao meio ambiente saudável.
Do total de vítimas, 25 delas foram no Brasil. Já a Colômbia registrou 79 casos.
“O número real de assassinatos é provavelmente maior”, afirma a organização. Desde que o acompanhamento começou a ser feito, em 2012, foram contabilizadas 2.106 mortes de ativistas defensores do meio ambiente e do uso coletivo dos recursos naturais.
A América Latina ainda é o lugar com mais assassinatos, com 85% de todos os casos documentados em 2023. Depois de Colômbia e Brasil, Honduras e México empataram na terceira colocação do ranking, com 18 crimes do tipo cada.
“O assassinato continua sendo uma estratégia comum para silenciar defensores e é, sem dúvidas, a mais brutal”, diz o relatório.
“Ataques letais geralmente ocorrem junto com retaliações mais amplas contra defensores que estão sendo alvos de governo, empresas e outros atores com violência, intimidação, campanhas de difamação e criminalização”, aponta a ONG.
Em relação ao ano anterior, o número de assassinatos de ambientalistas no Brasil teve uma queda, de 34 para 25 vítimas em 2023. A principal fonte de dados usada para o levantamento da Global Witness é a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que há décadas mapeia a violência no campo.
“Já faz anos que o Brasil se configura como uma das regiões mais perigosas para aqueles que fazem a defesa do meio ambiente e da luta pela terra. Não são apenas números, são nomes de pessoas que passaram por longo processo de difamação por fazerem a luta por seus direitos, por seus povos”, afirma à DW Ronilson Costa, coordenador nacional da CPT.
Uma das causas para o cenário, avalia Costa, é a concentração fundiária no Brasil e a demora do reconhecimento dos territórios indígenas e quilombolas. “Essas terras estão em disputa seja pela expansão do agronegócio, da exploração madeireira, minérios, ou projetos de infraestrutura”, justifica.
Dentre os casos emblemáticos que mais refletem essa situação, opina o representante da CPT, está o assassinato de Mãe Bernadete, liderança quilombola e religiosa na Bahia.
Ela foi morta com 12 tiros em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, e estava Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal por já sofrer ameaças.
As mortes de indígenas do povo Guarani Kaiowá, em Mato Grosso do Sul, também foram contabilizadas pela Global Witness. Em 2023, os corpos Sebastiana Galton e Rufino Velasque foram encontrados carbonizados na casa onde viviam, na Terra Indígena Guasuti, em Aral Moreira.
“Quando o Estado não atende à demanda urgente, ele coloca uma comunidade inteira numa situação de vulnerabilidade”, diz Costa.
O total de assassinatos registrados na Colômbia no ano passado, 79, foi o maior já contabilizado em um único país desde que a Global Witness começou a fazer esse levantamento em 2012. Na última década, pelo menos 461 defensores colombianos do meio ambiente foram silenciados.
“Muitas famílias foram afetadas de forma desproporcional por disputas territoriais e violações dos direitos humanos exacerbadas por mais de meio século de conflito armado”, pontua o relatório, que aponta o plantio de coca e o narcotráfico como catalisadores da violência.
No México, confrontos em torno da indústria da mineração aparecem como pano de fundo da maioria das mortes. Dos 18 assassinatos, 70% foram de indígenas que eram contrários à expansão de atividades mineradoras, afirma a Global Witness.
Empatada no terceiro lugar, Honduras, que tem 10 milhões de habitantes, é o país com a maior taxa per capita de assassinatos de ambientalistas. Segundo o levantamento, a pressão sobre a floresta tropical causada principalmente pela expansão de atividades que vão do agronegócio ao narcotráfico tem agravado a situação.
“Por pouco mais de uma década, os defensores desta região sofreram mais ataques per capita do que em qualquer outro lugar do mundo, com 97% deles registrados nos mesmos três países: Honduras, Guatemala e Nicarágua”, avalia o relatório.
Uma das recomendações para reverter o quadro violento é a documentação dos ataques e represálias sofridas pelos defensores do meio ambiente. Para especialistas, os governos só conseguirão aprimorar os programas de proteção de direitos humanos e das vítimas quando forem capazes de identificar as causas por trás dos ataques.
Uma tentativa foi feita pelo Acordo de Escazú, o primeiro tratado ambiental da América Latina e do Caribe, assinado em 2018 para promover os direitos de acesso à informação, à participação e à justiça em questões ambientais. Embora o Brasil tenha assinado o acordo no ano de sua criação, o país ainda não o ratificou.
Na avaliação da Global Witness, a falha do tratado não deve apenas à lentidão dos governos. “Empresas que atuam na região também precisam ser responsabilizadas pela violência e criminalização que os defensores ambientais enfrentam”, afirma no relatório.
Para a CPT, as denúncias feitas à comunidade internacional são importantes para expor o perigo que ativistas dos direitos humanos e da terra vivenciam no país. “Temos expectativa que cobranças para o Brasil sejam feitas no sentido de garantir maior monitoramento para empresas que financiam negócios no país que atuam em áreas de conflito e que promovem violência no campo”, diz Ronilson Costa.
Um bom exemplo recente citado por Costa vem da Europa. No início de setembro, o conselho de ética do Fundo Global do Governo da Noruega (GPFG) recomendou que o fundo exclua os investimentos na Prosegur, empresa espanhola que atua na área de segurança. No Brasil, a empresa mantém a subsidiária Segurpro, que presta serviços para a Vale e Agropalma, e está envolvida em casos de agressões e mortes contra indígenas no Pará.
Com informações do portal DW, parceiro do Metrópoles.