Brincando com os netos em sua sala, E.M. contou o quanto sofreu com a violência doméstica por parte do ex-companheiro durante anos de sua vida. Explicou que ainda sente muito medo, mas precisou romper com o ciclo de violência. Palavras agressivas constantemente faziam parte do seu cotidiano e a machucavam. As violências patrimoniais e psicológicas faziam parte do seu convívio familiar.
“É difícil reviver tudo. Ainda hoje não saio de casa só, fico com medo de ele tocar fogo na casa e eu não conseguir me defender. Durmo com temor, se escuto algum barulho fico sempre atenta. Quantas vezes pedi a Deus para que ele encontrasse alguém e fosse feliz, orei muito, e eu quero apenas paz”, disse.
Por meio de conselhos de parentes e depois de tantas ameaças, resolveu denunciar a violência que sofria. “Sinto-me mais segura com a Patrulha Maria da Penha, com as visitas e o apoio, sempre me tratam muito bem e com muito carinho e sou grata por isso”, agradeceu.
Já M.S.M. relatou uma vida de ameaças e perseguição após a separação. A proteção da Patrulha Maria da Penha deu a ela liberdade, algo que não possuía na relação violenta.
“Eu senti mais força com o apoio da Patrulha, hoje me sinto livre. Valeu a pena ter denunciado. Não tinha como sair na rua, não dormia direito. Tudo foi um terror, eu poderia estar morta hoje, pois ele só se afastou por conta da presença da patrulha”, pontuou.
Diante desses relatos emocionantes, o governo do Estado realizou nesta quarta-feira, 16, na sala do Comando-Geral da Polícia Militar, a solenidade de aniversário do primeiro ano da Patrulha Maria da Penha. O ato solene contou com a presença de autoridades e das mulheres vítimas de violência que são atendidas pela Patrulha.
A primeira-dama do Estado, Ana Paula Cameli, apoiadora da Patrulha Maria da Penha, disse na solenidade que a prevenção é a melhor medida a ser tomada para a diminuição dos altos índices de violência doméstica e familiar. “Muito me orgulho da Patrulha Maria da Penha pelo trabalho desenvolvido. Parabenizo toda a equipe por este primeiro ano de excelentes resultados. Acredito que em breve veremos outras mulheres tendo a coragem de denunciar e sair desse ciclo de violência”, salientou.
O secretário-adjunto de Estado de Justiça e Segurança Pública, Maurício Pinheiro disse que todas as mulheres que encabeçam o projeto estão de parabéns. “Pela coragem de encarar esse problema de frente e toda a equipe da Patrulha Maria da Penha pelo excelente trabalho”, destacou.
“Parabenizo o trabalho da Patrulha e dentro de nossas possibilidades precisamos ampliar esse projeto para os municípios. E precisamos fazer um trabalho forte nas escolas. Que esse aniversário se repita por muito tempo”, comandante-geral da Polícia Militar do Acre (PMAC), coronel Paulo César.
A desembargadora Eva Evangelista disse que lembra do momento que a primeira-dama a procurou para falar do projeto. “Uma mulher tão jovem preocupada com boas políticas públicas para as mulheres. Hoje comemoramos um ano desse belo trabalho da Patrulha Maria da Penha, realizando junto com o Poder Judiciário, governo do Estado e outros órgãos de justiça uma política de proteção às mulheres de forma efetiva. Estou muito feliz”, enfatizou a desembargadora.
“As mulheres atendidas elogiam esse trabalho da patrulha e estamos vendo a diminuição de violência e a proteção das mulheres sob medidas protetivas. Estamos contemplando os frutos colhidos e iremos colher muito mais, pois as famílias precisam ser preservadas”, salientou a juíza de Direito Shirlei Hage, titular da Vara de Proteção à Mulher da Comarca de Rio Branco.
História da Patrulha Maria da Penha
O Estado do Acre tem uma população feminina de 453 mil mulheres, segundo dados do IBGE de 2020 e infelizmente, tem a maior taxa de feminicídio do país, sendo o estado que menos denuncia a violência contra a mulher. Segundo dados referentes aos anos de 2018 e 2019 as taxas de homicídios dolosos são de 7 mortes a cada 100 mil mulheres. Já os casos de feminicídios são de 2,5 para cada 100 mil mulheres.
Dos sete estados da região Norte, o Acre foi o estado que registrou o maior índice de crime de feminicídio entre os meses de março e abril deste ano, durante a pandemia do novo coronavírus. Os dados foram levantados pelas secretarias de Segurança Pública de 20 estados.
E dentro desta necessidade no combate à violência doméstica e familiar e a proteção das mulheres, nasceu há um ano, o projeto Patrulha Maria da Penha, fruto de uma parceria entre o governo do Estado, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Estado do Acre. Criada pela Lei nº 3.473/2019 e por meio do Termo de Cooperação Técnica Nº 001/2019.
Inspirada na doutrina e atuação da Ronda Maria da Penha da Polícia Militar da Bahia, em 2 de setembro de 2019 foi iniciada a capacitação da primeira guarnição de policiais militares do Acre composta, obrigatoriamente, por no mínimo uma mulher, para atuação exclusiva no projeto Patrulha Maria da Penha.
Em 16 de setembro de 2019, iniciou-se a atuação direta no acompanhamento e fiscalização das medidas protetivas de urgência, sendo esta data o marco do início das atividades da Patrulha e também considerada a sua data de aniversário.
Trabalho
A Patrulha Maria da Penha apresenta-se como uma das medidas de proteção mais eficazes, para o enfrentamento e prevenção à violência doméstica e familiar praticada contra as mulheres no Estado do Acre, visto que as guarnições da patrulha estão diariamente em contato direto com as mulheres em situação de violência, tendo como missão primordial a fiscalização das Medidas Protetivas de Urgência deferidas em favor das mulheres vítimas de violência doméstica e/ou familiar cadastradas no aplicativo Botão da Vida.
Dessa forma, são realizadas visitas constantes buscando evitar o agravamento das ocorrências e, principalmente, reduzir os índices de feminicídios praticados contra as mulheres no Estado do Acre. Assim, por meio das Medidas Protetivas de Urgência e de informações remetidas pela Vara de Proteção à Mulher à Coordenação da Patrulha Maria da Penha, são elaborados diariamente cartões programas de visitação, a fim de que todas as demandas e solicitações sejam atendidas.
A presença constante de uma viatura caracterizada, com a logo da Patrulha Maria da Penha, realizando visitas às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar tem gerado impactos positivos e imediatos, atingindo diretamente as famílias das atendidas.
O agressor, com medo de possíveis sanções, sente-se coibido de reincidir na prática delituosa e, indiretamente, também a comunidade local, já que toda a vizinhança, ciente da presença constante da Polícia Militar no acompanhamento de uma mulher agredida, sente-se encorajada a denunciar casos semelhantes, além de outros agressores na região se sentirem ameaçados e com medo diante da presença de uma guarnição especializada, gerando, dessa forma, uma diminuição no cometimento dos vários tipos de violência contra a mulher.
A major Alexsandra Rocha, coordenadora da Patrulha Maria da Penha, explica que vivemos em um país machista, sexista e discriminatório contra as mulheres e a cultura predominante é de que a última palavra deve ser sempre a do homem.
“Tem sido um grande desafio trabalhar com mulheres que estão rompendo com um ciclo de violência, elas decidem não viver mais em um ambiente doentio. Nosso objetivo é convencermos elas de seus direitos e também os agressores de que a mulher não é um objeto, não é propriedade deles”, explicitou.
“São 550 mulheres que passaram pelo acompanhamento da patrulha e não tivemos casos de feminicídio, e nenhuma delas voltou para o ciclo de violência, e isso é muito positivo. Agora é ampliarmos esse trabalho e efetivarmos nossos projetos para todos os municípios do nosso estado. Nossa maior pretensão é investirmos nas futuras gerações com a prevenção, para que os meninos não se tornem adultos agressores”, completou.
Prevenção
Ao longo desse um ano de existência, a atuação da Patrulha Maria da Penha foi muito além da fiscalização isolada de medidas protetivas. O projeto contemplou campanhas destinadas à conscientização para o enfrentamento e prevenção da violência doméstica e familiar, tais como a campanha do Outubro Rosa; presentes para os filhos das atendidas no Natal; ação de informação e prevenção no Carnaval; Dia Internacional da Mulher; Dia Internacional de Luta pelo Fim da Violência Contra a Mulher; presença da Patrulha nos estádios de futebol (considerado um ambiente prioritariamente masculino) e também locais de grande fluxo, como, por exemplo, praças, o Terminal Urbano e outros; palestras nas universidades e escolas; blitz educativa; campanha nos supermercados, farmácias, hospitais e postos de saúde; atendimento de mulheres da zona rural; atuação em campanhas de conscientização em cidades do interior do estado; ação no Dia das Crianças presenteando os filhos das atendidas; Agosto Lilás, entre outros.
Tipos de violência contra a mulher – Saiba identificar
A Lei Maria da Penha define cinco formas de violência doméstica e familiar, deixando claro que não existe apenas a violência que deixa marcas físicas evidentes:
Violência psicológica: xingar, humilhar, ameaçar, intimidar e amedrontar; criticar continuamente, desvalorizar os atos e desconsiderar a opinião ou decisão da mulher; debochar publicamente, diminuir a autoestima; tentar fazer a mulher ficar confusa ou achar que está louca; controlar tudo o que ela faz, quando sai, com quem e aonde vai; usar os filhos para fazer chantagem – são alguns exemplos de violência psicológica, de acordo com a cartilha Viver sem violência é direito de toda mulher;
Violência física: bater e espancar; empurrar, atirar objetos, sacudir, morder ou puxar os cabelos; mutilar e torturar; usar arma branca, como faca ou ferramentas de trabalho, ou de fogo;
Violência sexual: forçar relações sexuais quando a mulher não quer ou quando estiver dormindo ou sem condições de consentir; fazer a mulher olhar imagens pornográficas quando ela não quer; obrigar a mulher a fazer sexo com outra(s) pessoa(s); impedir a mulher de prevenir a gravidez, forçá-la a engravidar ou ainda forçar o aborto quando ela não quiser;
Violência patrimonial: controlar, reter ou tirar dinheiro dela; causar danos de propósito a objetos de que ela gosta; destruir, reter objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais e outros bens e direitos;
Violência moral: fazer comentários ofensivos na frente de estranhos e/ou conhecidos; humilhar a mulher publicamente; expor a vida íntima do casal para outras pessoas, inclusive nas redes sociais; acusar publicamente a mulher de cometer crimes; inventar histórias e/ou falar mal da mulher para os outros com o intuito de diminuí-la perante amigos e parentes.
Fonte: Agência de Notícias do Acre.