Oficializar a união e formar uma família em Rio Claro (SP). Esse é o desejo em comum de Alan, Cristhian e Rodrigo, que nesta quarta-feira (12), Dia dos Namorados, completam um ano como um ‘trisal’, termo que remete ao relacionamento a três, também conhecido como poliamor.
“Decidimos deixar as coisas fluírem e foi tão espontâneo e natural que quando percebemos já estávamos morando juntos”, contou um dos namorados Rodrigo Farias.
História de amor
A história de amor entre eles começou quando o arquiteto Cristhian Carpiné e o fotógrafo Rodrigo Farias, que já namoravam há 4 anos, se apaixonaram pelo bailarino Alan Ribeiro.
Eles estavam em um relacionamento aberto há algum tempo e costumavam conhecer outros homens, até que viram Alan pela primeira vez no bar em que ele trabalhava.
“Nós ficamos loucos. Foram semanas investindo e tentando puxar assunto pela internet. Nas festas juninas enviamos correio elegante. Começamos a conversar mesmo por conta de uma música que o Cris compartilhou e ele gostou”, disse Rodrigo.
A música em questão era Bixinho, de Duda Beat, em que ela se declara para um amor que nunca havia conhecido antes. Na tentativa de conquistar seu coração, Rodrigo pediu que a cantora e compositora dedicasse um trecho da canção para Alan no Instagram. Ela atendeu ao pedido e, no Dia dos Namorados do ano passado, os três estavam oficialmente namorando.
“No início foi muito confuso pra nós três, principalmente para o Alan, que foi um pouco mais resistente por já existir uma relação entre eu e o Cris. Era algo completamente novo e fomos aos poucos aprendendo a lidar com os sentimentos”, disse.
Assumindo o relacionamento
No círculo de amigos do ‘trisal’, existem vários outros casais com diferentes formas de relacionamento, mas nenhum como eles. Eles contam que assumir o namoro para os amigos foi tranquilo, pois todos acompanharam a história e perceberam como os dois haviam se apaixonado pelo bailarino.
Já com a família, principalmente a do Cristhian, o tempo e o diálogo foram necessários. Depois de meses difíceis de resistência, a conversa levou os familiares à aceitação e, hoje, eles vão até a almoços em família. “A sobrinha do Alan, por exemplo, acha o máximo ter três tios”, contou.
Dificuldades
Questionados sobre as maiores dificuldades em manter um relacionamento a três, eles não surpreendem ao compartilhar problemas de relacionamentos comuns. Para eles, lidar com as diferentes intensidades de opiniões e desejos são os pontos que mais exigem maturidade na relação.
“As DRs [discussões de relacionamento] são quase uma reunião de condomínio. Gostamos muito de conversar sobre tudo. Acredito que clareza e diálogo seja essencial em qualquer relacionamento e isso deixa o nosso mais leve”, contou Rodrigo.
Depois disso, vem a necessidade de entender que a relação que cada um tem com o outro é diferente, mas o sentimento envolvido é o mesmo e, por isso, é preciso trabalhar cada vez mais a paciência e a compreensão para manter o relacionamento saudável.
O famigerado ciúmes, comum a quase todos os relacionamentos amorosos, também é uma coisa que foi trabalhada e, hoje, não gera mais insegurança entre eles. Qual o nome do remédio? Novamente, o diálogo.
“Sempre conversamos bastante sobre isso [ciúmes] e deixamos muito claro nossos sentimentos com o outro”, disse.
Melhores partes
Na contramão de todas as coisas que poderiam ter dado errado, o ‘trisal’ prefere lembrar dos motivos que levaram os três a viver o que eles têm hoje.
Para Rodrigo, uma das lembranças preferidas é saber que quando se apaixonaram pelo Alan, o Cristhian e ele não estavam buscando outra pessoa para completar o relacionamento, pelo contrário, o então casal estava extremamente bem.
Por isso, o fotógrafo acredita que tudo o que aconteceu triplicou a sua felicidade. “Vivo em um relacionamento repleto de amor, carinho e zelo. Gosto muito do cuidado que temos um com o outro”, contou.
Já para o Cristhian, a melhor parte desse relacionamento é a possibilidade de encontrar no outro um apoio para os momentos difíceis. “Gosto que quando um não está por perto ou bem pra conversar, tenho o outro pra cuidar de mim”, contou.
O Alan, contudo, se atrai pelo aprendizado diário que tem sobre si próprio, sobre os namorados e sobre como lidar com as situações.
“É maravilhoso saber que o amor é muito além do que nos disseram. O afeto, o diálogo, o sexo, a convivência, tudo me toca. Acordar junto, ouvir um disco da Gal, o café bem doce, que antes eu tomava sem açúcar. Gosto da sensação de saber que somos uma família”, disse.
Amor normal
Entre todas as perguntas possíveis, o ‘trisal’ conta que, por incrível que pareça, a mais comum é a se eles dormem na mesma cama. A resposta é sim, desde quando Alan se mudou para a casa em que moram há um ano. “Nossa cama é queen, mas estamos em busca de uma maior, talvez uma king size”, contou.
Nesta quarta-feira (12), no Dia dos Namorados, os três não vão trocar presentes, porque escolheram viajar para o campo e viver mais uma experiência. Juntos, eles já foram para Santiago, no Chile, e fizeram uma viagem de 10 horas de carro para Santa Catarina, onde parte da família do Alan mora.
“Algumas pessoas desacreditam ou duvidam que seja possível um namoro como o nosso ser verdadeiro. Existe amor, companheirismo e problemas como qualquer outro casal: brigamos, discutimos, dividimos as contas e as tarefas de casa. Nosso relacionamento é normal”, disse.
Sem reconhecimento
A pedido da Associação de Direito de Família e das Sucessões, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu que os cartórios não podem registrar como união estável as relações poliafetivas (de três ou mais pessoas) em junho do ano passado.
O sonho do ‘trisal’ de Rio Claro ainda é distante, mas não deixa de existir. Para Rodrigo, oficializar a união estável em que vivem é uma questão de direito e segurança.
“Apesar do momento de grande pressão conservadora, o Brasil é um Estado laico, determinado na constituição e as novas leis não devem ser influenciadas, principalmente por questões religiosas. Relacionamentos como o nosso são uma realidade e não podem ser invisibilizados, a liberdade do novo planejamento familiar deve ser respeitada”, disse.
Depois da determinação do CNJ, o primeiro relacionamento poliafetivo registrado em Tupã (SP) foi considerado inconstitucional e perdeu a validade.
G1