O dólar passou dos R$ 4 e a reforma da Previdência está pendurada, mas, desde a última sexta, o que tem provocado debates realmente acalorados entre os brasileiros é a versão nacional de Paula Fernandes e Luan Santana para o hit “Shallow”, de Lady Gaga.
Vencedora do Oscar, a música-tema do filme “Nasce uma Estrela” é um hit e teria tudo para repetir o feito no timbre dos sertanejos. O que chamou mais a atenção, no entanto, foi a insistência da dupla em evocar a canção original, produzindo uma mistura de inglês e português que deixou o refrão incompreensível. Afinal, o que significaria “juntos e shallow now”?
Os versos de Gaga falam de um amor tão profundo que está longe do superficial, enquanto a faixa de Paula e Luan expõe um casal que tenta se reconciliar.
“A ideia da letra é celebrar a canção original junto com a minha versão, e não tradução. Por isso a mistura dos idiomas. Também entendo que o ‘shallow’ é a parte que os brasileiros mais sabem cantar da música original”, defendeu a cantora em suas redes sociais.
O episódio mostrou quão difícil é a vida do versionista, que precisa se equilibrar entre uma criação autoral e a ode ao original e estar pronto para o julgamento alheio.
Responsável por assinar versões brasileiras de musicais de prestígio, como “Wicked” e “Sunset Boulevard”, Mariana Elisabetsky tem um trabalho ainda mais difícil, já que precisa preservar tanto a melodia quanto a história que está sendo narrada a partir da canção, algo essencial para o entendimento da trama.
“Uma grande exigência do teatro musical é seguir o mesmo número de notas do original e manter a prosódia, com a tônica da palavra no acento da música”, explica ela. Outro empecilho são as diferenças entre idiomas.
“O inglês é muito econômico. Com poucas sílabas, ele já diz muito. O português é mais prolixo, então não cabe fazer uma tradução literal. Precisamos entender quais são as partes mais importantes e focar para fazer aquilo caber”, diz ela, que faz parcerias com Victor Mühlethaler.
Versões podem ter motivações artísticas ou mercadológicas, como lembra Thedy, e podem impulsionar a divulgação de um trabalho entre outros públicos, como aconteceu com a Bossa Nova ao ser traduzida para o inglês.
“Uma versão que visa o sucesso é uma coisa diferente de uma recriação. O artista tem que ter liberdade para fazer o que quiser, mas também tem que ter presença de espírito para entender que as pessoas têm liberdade para criticar”, conclui o músico.