A história de como o ‘menino pobre’ do seringal Grajaú tornou-se proprietário de uma das maiores fortunas da região, poderia ser contada como um modelo de inspiração sobre sucesso e vitória pessoal através do trabalho duro e incansável. Mas certamente, essa não é a história de Vagner Sales.
Sem nunca ter exercido qualquer outra profissão na vida, a história da fortuna pessoal de Vagner Sales é mais parecida com a de outros tantos políticos profissionais, que sem nunca terem exercido qualquer outra atividade produtiva, ainda assim, acumulam milhões em renda e patrimônio.
Eleito pela primeira vez vereador em 1982, Vagner Sales exerceu cargo político como deputado estadual entre 1990 e 1998 e desde 2008 é prefeito de Cruzeiro do Sul.
Ainda que Vagner fizesse a proeza de guardar integralmente seu salário, é pouco provável que conseguisse acumular tamanha fortuna.
Fortuna Subestimada
Mais improvável ainda é que a sua propriedade urbana, a fazenda declarada em mil hectares, duas mil cabeças de gado, seus famosos cavalos de raça (não mencionados na declaração), o galpão e a mansão de três andares caibam em sua declaração ao TRE.
O valor declarado de sua fazenda é de 780 mil. Segundo uma pesquisa imobiliária o valor do hectare em propriedades naquela região mesmo sem asfalto é avaliado em 60 mil reais/ha. Ou seja, somente a área, valeria, no mínimo 6 milhões de reais, isso se não tivesse acesso asfaltado.
Contudo, moradores da região dos badejos (ramais próximos) afirmam que os mil hectares de sua fazenda são apenas a parte inicial dos imóveis, e que na verdade, Vagner já teria adquirido propriedades circunvizinhas.
Já seria muito difícil criar mesmo o seu rebanho declarado de duas mil cabeças de gado em apenas mil hectares, mas a suspeita, é que seu rebanho seja de aproximadamente 3.600 cabeças, quantidade de vacinas adquiridas no comércio local.
Já a ‘casa do povo’, na avenida Mâncio Lima cujo valor declarado foi de 200 mil reais, foi avaliado por uma imobiliária em dois milhões de reais.
‘Casa do Povo’ X ‘Mansão dos Escolhidos’
O sucesso político de Vagner Sales explica-se em grande parte pelo seu populismo. Usar a aparência, o linguajar e atitudes de ‘homem simples e do povo’ sempre foi uma de suas armas na política.
Para alimentar o mito de ‘homem simples’, Vagner mantém uma residência na avenida Mâncio Lima, apelidada por ele mesmo de ‘a casa do povo’. É de lá que Vagner de fato toma as decisões relativas à cidade de Cruzeiro do Sul, recebe aliados e trama os próximos passos na política.
É lá também que pratica o assistencialismo mais personalista e descarado possível e onde a população mais carente se vê obrigado a esmolar remédios, exames e serviços assegurados por lei e que deveriam ser encontrados nos postos de saúde, por exemplo.
Vagner gosta de se orgulhar de sua ‘casa sem muros’, como parte essencial de sua política assistencialista.
Mas a ‘casa do povo’ é apenas uma máscara, um escritório político. Sua verdadeira residência é a mansão de três andares na sua fazenda, onde apenas poucos escolhidos são convidados a comparecer, não sem antes serem advertidos para não tirar quaisquer fotos do local.
Peculato
Uma das formas, digamos ‘tradicionais’, com que políticos corruptos incrementam sua renda, é se apropriar indevidamente de verbas auxiliares do mandato de deputado. O caso se aplica a Vagner Sales, condenado nas três instâncias por peculato. Para o judiciário do país, Vagner não aplicou corretamente e nem prestou contas das verbas a que tinha direito para viagens aéreas. Para tanto, utilizou-se de uma empresa laranja, a Aril Tur, com a qual simulava viagens e emitia notas frias. A condenação o tornou inelegível perante a lei da ficha limpa, o que impediria seu registro de candidatura na última eleição. Uma providencial desatenção por parte da Justiça Eleitoral e do MP permitiram, que contrariando a lei, fosse efetuado o registro de candidatura. Vagner deveria ter tido seu mandato cassado, mas, mais uma vez,a morosidade da justiça o beneficiou, com o crime prescrevendo antes da determinação da sentença.
Complexo de Piscicultura sem licença
Uma fotografia aérea de sua fazenda revela é possível contar pelo menos 46 tanques de piscicultura que não constam em sua declaração. Trata-se de um verdadeiro complexo de piscicultura. Máquinas trabalham na construção de novos tanques, em outra parte da propriedade.
Uma estimativa média, levando-se em consideração apenas as horas máquina utilizadas para a construção dos tanques é de aproximadamente 480 mil reais.
Segundo o mapa do Google Earth, a área está localizada no lado acreano da linha Cunha Gomes, contudo, não consta no IMAC que Vagner tenha solicitado a licença ambiental necessária para a construção dos tanques, (como exigido aos demais empresários do setor) o que caracteriza crime ambiental.
Roubo de Tratores
Vagner Sales protagonizou pelo menos dois casos de roubo de tratores , ou se preferir, apropriação indébita de máquinas agrícolas, e ainda, um terceiro, em que usou máquinas da prefeitura para execução de serviços pessoais em sua fazenda.
A primeira delas foi um trator de pneu da Cooperativa Agrícola Mista de Cruzeiro do Sul, ainda na gestão de José Saraiva no STR. Vagner pediu o trator emprestado à cooperativa e não o devolveu. Ao invés disso, mandou deixar na frente da cooperativa, uma carcaça completamente destruída de outra máquina agrícola.
Na segunda vez, o descaramento foi ainda maior. Vagner apropriou-se de um trator da extinta Colonacre (empresa do governo que dava suporte à produção) e chegou a vendê-la a um empresário local, com o acordo de que antes, a máquina seria utilizada para fazer um trabalho em sua fazenda.
O crime aconteceu durante o governo interino de Edson Cadaxo e foi necessária uma operação policial para retirada da máquina, que passou dias apreendida na delegacia. Nas ruas, a circunstância foi alvo da ironia popular: ‘o ladrão está solto, e o trator, algemado’. O caso reside na memória popular dos trabalhadores rurais de Cruzeiro do Sul.
Na terceira vez, Vagner contou com a anuência do então prefeito da cidade, Aluísio Bezerra, para usar um trator da prefeitura para realizar trabalhos particulares em sua fazenda. Para mascarar a uso indevido, foi forjado um contrato posterior ao ocorrido.
Por último (até agora), Vagner desviou recursos da SUFRAMA que seriam utilizados para asfaltar trechos de ramais, para asfaltar o acesso à sua própria fazenda. O recurso do governo federal destinado a beneficiar dezenas de produtores, valorizou ainda mais a sua propriedade, uma das apenas duas que receberam o asfalto.
Sem resposta
O jornal Juruá Em Tempo encaminhou, ainda na última quinta-feira, através de um email para a sua assessoria de comunicação, algumas perguntas para que fosse dada a oportunidade para que o mesmo manifestasse sua versão sobre os fatos levantados, contudo, até o momento da postagem desta reportagem, ainda não havíamos recebido uma resposta.